domingo, 31 de julho de 2011


Hoje, antes de atravessar a rua, olhei para o meu lado direito e vi Ofeu e Eurídice, ali parados. Persona e pessoa. Talvez reflexo... talvez sim, talvez não. Entre o sinal amarelo e vermelho, Eurídice atrai os olhares. Baixa a cabeça. Entre o sinal vermelho e verde, Orfeu avança. Começa a caminhar. E, incorrigível, olha pra trás! Dúvida eterna...

quarta-feira, 27 de julho de 2011




Als das Kind Kind was







Quando a criança era criança, balançava os braços.Desejava que o riacho fosse rio, que o ri fosse torrente...e essa poça, o mar.




Quando a criança era criança, não sabia que era criança.Tudo era cheio de vida e a vida era uma só.
Quando a criança era criança não tinha opinião...Não tinha hábitos, sentava-se de pernas cruzadas, saía correndo...Tinha um redemoinho nos cabelos e não fazia pose para fotos.
Quando a criança era criança, era tempo destas perguntas:
Por que eu sou eu e não você?Por que estou aqui e por que não lá?
Quando começou o tempo e onde termina o espaço?
Será que a vida sob o sol nada mais é que um sonho?
Será que o que vejo escuto e cheiro não é apenas uma miragem do mundo anterior ao mundo?Será que realmente existe o Mal e pessoas malvadas?
Como é possível?Eu, que sou eu, não exista antes de existir.
E, no futuro, eu, que sou eu...Não serei mais quem eu sou.

" O sol da manhã. Os olhos da criança. Banho na cachoeira. As primeiras gotas de chuva. O sol. O pão e o vinho. O salto. A Páscoa. As nervuras das folhas. O vento no capim. A cor das pedras. Os seixos no fundo do rio. A toalha de mesa branca ao ar livre. Sonhar com uma casa na casa. O ente querido dormindo no quarto ao lado. O domingo tranquilo. O horizonte. A luz do quarto no jardim. O voo noturno. Andar de bicicleta sem segurar. A bela desconhecida. Meu pai. Minha mãe. Minha esposa. Meu filho."

Quando a criança era criança, detestava espinafre, ervilhas,arroz-doce e couve-flor refogada.Agora ela come de tudo e não apenas porque precisa.
Quando a criança era criança acordou numa cama estranha...E hoje isso é frequente.
Muitas pessoas lhe pareciam bonitas antes...Hoje é raro, só com sorte.
Tinha uma visão clara do paraíso...Hoje consegue apenas supor.
Não conseguia imaginar o nada...Hoje treme ao pensar.
Quando a criança era criança, brincava com entuiasmo...Hoje só se entusiasma quando seu trabalho está envolvido.
Quando a criança era criança, era tempo das perguntas:
Por que eu sou eu e não você?
Por que estou ali e não aqui?
Quando começa o tempo e onde termina o espaço?
Será que a vida debaixo do sol nada mais é do que um sonho?
Quando a criança era criança, vivia de maças e pão...E ainda é assim.
Quando a criança era criança, amoras caíam em suas mãos...E ainda é assim.
As nozes deixavam suas línguas ásperas...E ainda o fazem.
Ao chegar chegar ao topo da montanha, queria outra mais alta.Em cada cidade, deseja outra cidade maior.E ainda o faz.
Subia nas árvores para colher cerejas com grande alegria, como hoje.
Ficava tímida diante de estranhos, e ainda fica.
Aguardava a primeira neve...E continua aguardando.
Quando a criança era criança, atirou uma lança de madeira contra uma árvore...A qual tremula ali ainda hoje.
"Algo aconteceu.Ainda está acontecendo.Me prende.
Foi verdade à noite e é verdade agora, neste momento.
Quem foi quem?Estive dentro dela e ela em volta de mim.Quem neste mundo pode dizer que já esteve unido a outro ser?Eu estou unido.Nenhuma criança mortal foi concebida mas sim um quadro imortal compartilhado.Aprendi sobre estupefação esta noite.Ela me levou pra casa, e encontrei meu lar.Aconteceu uma vez.Aconteceu uma vez, portanto vai acontecer.
A imagem que criamos me acompanhará até morrer.Terei vivido em seu interior.Somente a estupefação com nós dois...A estupefação com o homem e a mulher me tornou humano."
Eu agora sei o que nenhum anjo sabe!

do filme "Asas do Desejo", de Win Wenders.




































































































































































































































































































































































































































































quarta-feira, 6 de julho de 2011



Dizer sim a um instante é dizer sim a toda existência!

Waking Life! O que é sonho e o que é real? “Sonho é destino!”, diriam alguns.

Em um dos diálogos desse filme, uma moça questiona o fato de que quando somos jovens e, sendo assim supostamente mais distantes da morte, nossas ações são impulsivas, como se tudo fosse acabar amanhã e temos essa certa urgência em tudo o que fazemos. E à medida que o tempo passa e vamos ficando mais velhos, adquirimos calma apesar de estarmos cada vez mais próximos do fim. Não é um paradoxo? Não deveríamos ficar cada vez mais aflitos com o fato do dead line se aproximar? Ou não? Vamos nos acostumando com o dia após dia e esquecemos o curto tempo que temos? Ou simplesmente entendemos e aceitamos o jogo, seja ele qual for? Eu não saberia responder, nem sei se quero e se é realmente necessário. Talvez seja como diz a Clarice Lispector: Viver supera qualquer entendimento!

E são tantas pequenas surpresas que nos aparecem... a cada instante!!! Eu sempre tive a sensação de que temos uma rédea, como se nossa vida fosse uma biga romana e vamos ali, conduzindo na direção que queremos, como que queremos, na hora que queremos, enfim... Mas de repente aparece uma rédea maior e vira a direção! E ficamos ali tentando equilibrar tudo, ou melhor, eu fico na equação; o meu desejo x o do que me surpreende. Talvez não devesse tentar guiar, devesse me deixar ser... Não sei... Mas essa sensação de que quando dizemos sim a um momento dizemos a uma existência é pertinente, já que uma existência é o agora, o ontem e o amanhã, numa grande mistura filosófica.
Porém, e se viramos a nossa briga pra uma estrada fora do curso? Bom, aí já pressuponho que havia um!rs Sem entrar nesse questionamento , que é ainda mais amplo, mas sim na sensação de estar fora de curso. Seria isso intuição? Medo? Ou simplesmente uma questão inerente a quem se põe a pensar sobre a vida? Porque o contrário também é verdadeiro, dizer não a um instante é dizer não a toda uma existência!

Quando eu era criança acreditava numa espécie de jogo. Era assim:

Eu acreditava que havia duas de mim: eu mesma, com minha família e outra que morava num lugar muito distante, no Alasca, que pra mim era o lugar mais distante que poderia ter! E não era só eu, todos tinham essa espécie de duplo. Eu sempre ficava pensando o que a outra de mim estaria fazendo agora? Será que diante de essa situação ela faria o mesmo? E vivia quase que diariamente nesse questionário sem fim. Porque o jogo funcionava dessa forma: no final
( daí não saberia explicar exatamente do que, se da vida, enfim...era apenas uma criança!) seriam comparadas as ações e a que conseguisse as melhores saídas poderia ter a vida única, só pra ela, seria enfim um único ser. Realmente acreditava nisso e às vezes perguntava aos que estavam em volta como estavam os seus “outros”. Acreditava também que durante o sonho (o de quando estamos adormecidos!) combinávamos o que iríamos fazer no dia ou em períodos próximos. Discutíamos (não sei com quem!) e decidíamos o que seria melhor. Porém, ao acordarmos, poderíamos ou não fazer o combinado.

E aí é que está: Éramos livres pras escolhas! Éramos? Somos! sempre somos!Eu tinha uns cinco anos.. Waking Life!







foto: Alécio Cezar